quarta-feira, 30 de setembro de 2015

Voltei

Faz tempo que não escrevo. Desde que entrei na faculdade, na verdade. Muito me questiono a razão disso. Todos os dias, para ser exata. Justamente na universidade é que a mente borbulha e as idéias se inovam. Mas acho que meu curso não colabora. É tudo muito cinza, sabe? E preto. No máximo, um azul escuro...
A faculdade me danificou. Antes escrevia com vírgulas. Agora só sei fazer uso do ponto final. Muitos crimes, muita tragédia, muita frieza, imparcialidade, distanciamento... Sou treinada para isso. E escrever requer o contrário. Irônico.
Outra coisa: parei de ler literatura. E "dos delitos e das penas" não vale. Isso não é literatura. É direito penal camuflado de coisa boa. - Não é -.
Vivo escutando que todo estudante de direito namora penal, mas casa com civil. Eu não namoro nada disso. Gosto, fico, pego, me divirto, mas namorar é demais.
Você deve estar achando que odeio meu curso. Não odeio. Nem amo. É um curso, ora, apenas isso. O mundo tenta nos convencer de que devemos trabalhar com o que amamos. É outra ironia. Quem ama trabalho, meu povo? Paciência! Mesmo viajar, quando se torna trabalho, perde o brilho. Mas eu gosto, sim, de direito - com 'd' minúsculo, mesmo. Gosto de ler sobre, conversar a respeito... E um dia vou ganhar a vida com isso. Tentar ajudar alguém aqui, outro ali, tentar ser justa, imparcial, bla, bla bla... Ainda acho que justiça se faz quando a vítima se sente justiçada. Mas isso soa equivocado até para mim. - Desculpe a parcialidade.
Bem, estou tão enferrujada que esse texto já perdeu o foco.
Eu queria falar sobre ironias. Já citei algumas aqui.
Estava estudando, quando lembrei da moça que vi aos trapos na rua enquanto eu caminhava em direção ao congresso de direito constitucional, aquele mesmo que fala sobre ''direitos humanos'' e ''dignidade da pessoa humana''. Mas essa é só parte da ironia. Ela toda vem agora, quando explico a vocês como me senti ali.
Roupa social, formal, ligeiramente maquiada, indo encontrar com pessoas igualmente trajadas... Mulheres de salto, homens de terno e aquela moça mal vestida, suja, fedorenta, cabelo oleoso - não brilhoso, nem macio; seboso.
A foi ali, mesmo, na minha frente, sem diplomacia alguma, que ela abaixou o que restava de uma calça, pôs sua bunda para fora e defecou na calçada. Cru assim, exposto assim. Minha primeira reação foi desviar o olhar: primeiro por nojo, depois por anseio de querer lhe dar uma mísera privacidade. Privacidade... Vivo reclamando da minha. Mas nunca precisei fazer cocô em local público.
A ironia maior, meus caros, foi ver estampado no rosto daquela mulher que o que leio e escuto no meu curso não passam de uma fábula. Isso é uma grande ironia. Ir para o congresso de direito constitucional e me deparar com aquela mulher, aquela cena e nada poder fazer. Ou até poder, mas por imaturidade, não saber o quê.
E depois fiquei pensando na quantidade de pessoas em situação igual, ou pior, em outras cidades, outros estados, países... É como se a cegueira branca de saramago tivesse tomado conta do mundo. Tomado conta de mim.
Fui ao congresso, achei interessante algumas falas, outras nem tanto, quase dormi em alguns momentos. Mas se perguntarem o que lembro: nada. Só há espaço para aquela cena. Aquela mulher...
O congresso terminou e sabe o que vi no caminho da volta? As fezes daquela mulher. Estavam lá, na calçada, expostas, fedendo e desfigurando a paisagem de ternos e saltos em volta.
E eu queria retribuir àquela mulher o favor que ela me fez. Me lembrou por qual motivo eu escrevia.
Voltei.

quarta-feira, 4 de junho de 2014

A minha lente

Por trás da lente
Me escondo
Finjo ser
Confesso não sou
Tento o tempo
Para me refazer
Fito a gente
No anonimato
Por trás da lente
A lágrima escorre
Merda
Agora sou
Uma sem-lente

domingo, 9 de março de 2014

Nada

É esquisito pensar em todos os amores,
Tudo o que foi dito, vivido, planejado,
Beijos que murcharam com as flores,
Sonhos sequer iniciados e já findados.

De qualquer maneira, pensei.
Pensei naquele beijo e no arfar
Resgatei o bom e gostei...
Gostei tanto que é melhor pular.

- Existem coisas na vida que mantém o seu valor.
Mas, sinceramente, ainda bem que acabou. -

Pulei para a eletricidade que fluía,
Tão viva e maciça, dentro de mim;
Era gostoso e tamanha a alegria,
Mas todo o resto nos levou ao fim.

E agora, de você, não quero nada.
Não penso nada.
Não trago nada.
Pois bem, voltei para minha estrada.