domingo, 30 de dezembro de 2012

Uma janela é infeliz fechada

Deitada em minha cama, perdida em lembranças de quando eu era menina, me pergunto se você gostaria do meu sorriso de ''janelinha''... É, eu te transporto até para onde você nem me existia. Me viro e vejo o porta-retrato cinza que ganhei de natal da sua avó. Ele parece se mexer. De repente, me entoando espanto, ouço o murmúrio: é a mulher da fotografia, vestida de noiva e feliz no colo de seu marido, resmungando para mim.
-O que é que você tem?!
-Você fala?
Respondo incrédula - Era uma situação improvável, eu estava mesmo falando com uma fotografia?
-Não, é tudo uma ligeira impressão sua... - Ela respondeu com ironia, pois sabia do meu hábito de dar essa resposta à perguntas tolas - É claro que estou falando, sua boba! O que é que você tem dentro dessa cabeça?!
-Bem, estou lembrando da minha infância, talvez; qual o problema?
Eu ainda resistia a ideia de que estava mesmo conversando com a noiva da fotografia e ainda mais que ela estava enfurecida comigo; rezei para que ninguém me visse naquela situação.
-Qual o problema mocinha? Qual o problema?! O problema é que você é um tanto orgulhosa, não acha?! Mas é claro que acha, mas dirá que tem suas razões, afinal, você é orgulhosa demais para admitir que é orgulhosa por pura infantilidade! Você pensa que não estou vendo seu estado... É evidente que está se corroendo por dentro por ter agido dessa forma e veja só a que ponto chegou; fez-se necessária a intervenção de uma foto!
Irritada, respondo.
-Quem você pensa que é para falar dessa forma comigo?! Você acha que me conhece... Está no meu quarto a menos tempo do que estou em mim mesma e pensa que sabe algo de mim; pois lhe digo que não sabe nada! E mais, não ouse dar pitacos, ou te ponho na sala-de-estar para vigiar a vida das visitas!!
-Pois me coloque onde quiser, só paro de dar ''pitacos'' quando você parar de agir feito uma imbecil!
-Auto-lá! Quem você pensa que é para chamar a Gabi de ''imbecil''? Tudo bem que ela é orgulhosa e geniosa, mas também é muito amável e só cobra dos outros, porque cobram dela!
Interviu meu Snoopy de pelúcia em minha defesa.
-Obrigada Snoopy, mas pode ir cochilar, dessa noiva barata cuido eu!
Dou um sorrisinho de gratidão e um beijo na testa da minha pelúcia. Volto para a discussão...
-Olha só, eu sou mesmo geniosa e dificílima de lidar, mas o que é que você perde com isso? E se eu mudar, o que você ganha? Ora, me deixe em paz! Já é desgastante arcar com as consequências do meu teimoso orgulho e ainda ter de ouvir conselhos descartáveis no meu momento de paz?! Não mesmo! Cale a boca já!
-Quem perde é você, Gabi... -A noiva falava num tom materno e amigável, de quem só queria meu bem e eu sabia que sim, mas me espantei com a mudança no clima da conversa - Não percebe todo o mal que está fazendo a ele? Não percebe toda a dor e peso que traz a si mesma? Para de teimosia menina, aprenda a relevar. Saiba conviver melhor com seus defeitos e com os defeitos dos outros, principalmente dos que te amam... Você pensa que é legal te ver me encarando no colo do meu esposo? E você acha mesmo que não vejo em seus olhos o quanto você quer ser feliz como eu um dia e com ele, do mesmo jeitinho que estou na foto? Eu sinto seu olhar de decepção consigo mesma cada vez que age dessa forma, é como se essa possível realidade ganhasse alguns metros de distância da concretização, eu vejo. 
A noiva me encarava com ternura e com uma ponta de piedade, aquilo me revoltava, eu não queria piedade, eu não precisava disso! Já ia me pronunciar em reprovação, quando abri a boca...
-Mas, você...!!
-Shiii...
Interrompeu-me a noiva, colocando o indicador sob os lábios e lembrou-me...
-Releve...
A noiva sorriu, voltou para o colo de seu noivo dentro da fotografia, o deu um beijo e piscou para mim, retribui. Virei-me na cama um pouco irritada e dei de cara com meu Snoopy, ele sorria para mim, me tranquilizei.
-Dorme bem Gabi...
-Só se for abraçada com você...
Disse num tom de brincadeira; Snoopy gargalhou e perguntou.
-Ele não vai ter ciúmes?
-Que nada! Depois eu me acerto... Vem cá...
Puxei minha pelúcia para um abraço, fechei os olhos e adormeci leve.

sexta-feira, 14 de dezembro de 2012

Reviravolta

As perturbações me perseguem; não em pensamento ou no coração, mas na alma. Eu transpiro stress, eu falo irritada e durmo com problemas; ''durmo''. Engulo cada pedrinha do dia-a-dia, cada sapo que me empurram goela abaixo e tolero qualquer frase mal feita ou aquele famoso ''Não quis dizer isso'' e até entonações erradas. Eu aguento, não firme e nem forte, mas estou aqui, não estou? Minha perna bambeia sim, eu fico tonta, ''piso na bola'', mas permaneço aqui e ai de quem ousar tentar me tirar. Eu pareço uma bombinha, saio gritando ao mundo minha indignação, minha revolta e meus palavreados mais chulos; machuco quem não merece, quem não tem haver, quem ta aqui para o meu bem e às vezes quem ta aqui para o contrário -ainda bem! Falo o que não devo, faço o que não quero, me encho de orgulho, bato no peito e em seguida morro de arrependimento; engulo o orgulho amargo no sabor de um gole único e corro atrás do prejuízo. Pois sei que não há mal que não se converta em luz. Eu me mantenho aqui, o mais firme e ereta que meus músculos aguentam, ainda que eu não aguente mais nada, pois sei que enquanto aqui é noite, do outro lado é dia.

quarta-feira, 28 de novembro de 2012

Mero surreal

  Estava na escuridão, eu enxergava a vida com sofreguidão e o amor, como dor. Você veio e acalmou as tempestades, fez-me reviver... És a minha luz no fim do túnel, o meu anjo da guarda, enviado pela divindade com o propósito de enaltecer meu lado bom e reajustar minha face ruim. É de ti que encho-me quando me sinto só, são as suas lembranças que tiram-me do Reino de Hades, que por muito pelejo em sair e eis que estou a conseguir; aos poucos, em passo sutil mas pertinente. Tens sido a corda que me puxa para o alto e retira-me do fundo do poço, a brisa que afaga minha pele calorenta, o riso que contagia meu olhar, meu olhar que mansamente se abre para ver a vida passar novamente, para ver a vida nova, para ver a vida.
  Agradeço ao aperto por me dar o prazer do alívio folgado e espreguiçado, de quem desperta de um ano e meio de pesadelos... Sou reta, direta; fato. Já me escondi em demasia, agora me exibo; grito aos quatro cantos a alegria que torna a bater em meu peito. Essa alegria tem seu nome e seu nome me liberta desse inferno casual.
  Tua presença tem amplitude maior que um mero ''surreal'', te peço que ignore toda e qualquer tentativa frustrada de descrever a magnificência que és. Respirar teu cheiro, te sentir na ponta da língua com um beijo molhado e selado, livre de qualquer maldade humana, divina ou satânica; beijo de um amor parnasiano. Abraço quente, semelhante ao cobertor que cobre uma criança em noite de chuva e trovão. Esse carinho e zelo que tanto almejei... Tudo é tão certeiro e inexplicável, ainda bem.
  Queria esquecer essa loucura de passado, enterrar qualquer nebulosidade vã; não dá. Mas não vamos nos afligir, aprendo a lidar. Engulo qualquer indiferença de gente pequena pelo sofrimento que me causou - verbo no passado. Passou, não volta e estás aqui, não há o que temer, é me entregar de corpo, me entregar de alma; te entrego meu bem e meu mal, é tudo teu.
  Tua fala mansa e teu olhar de cautela me paralisam; faz-me sentir a eletricidade dessa paixão em cada vértebra da coluna, eriça meus pelos e rosa minhas bochechas. Sintomas de quem quer entrar nessa e não voltar mais, de quem larga tudo e se arisca a errar só pelo prazer de tentar. É contigo que quero re-construir-me, é contigo que quero construir uma vida, seja longa ou não; é contigo.

domingo, 18 de novembro de 2012

Morrer é viver e vice-versa

Cansados de cobranças, frustrações e da arte de lidar, por fim, decidiram se isolar. Sim, isolaram-se de tudo e o tudo incluía o nada. Fugiram do que os prendiam, deixaram para trás, largaram de mão... Celular e telefone ou TV e computador, tudo parecia conspirar... Não paravam de alarmar ou tentar pelos vícios fúteis de uma sociedade a qual tentavam não mais pertencer. Eles tentavam esquecer o mundo e o mundo os lembravam de não o esquecer. Recusaram; rígidos e fortes, rejeitaram todas as chamadas ou até ignoraram o tédio. O silêncio era o pior inimigo, a mais alta e perturbante agonia, pois já não se ouviam os ruídos de motor, as crianças chorando, os cachorros esfomeados ou o namorar dos gatos durante a madrugada, mas a inquietação do silêncio era extremamente irritante, o silêncio morto e gritante que insistia em cobrir qualquer poluição sonora, qualquer sonoridade de vida, qualquer prova de que eles mesmos estavam vivos.  Nada cabia no curto e penumbro espaço entre eles e ali só havia lugar para o amor e o conjunto de ilusões que trazia consigo. Era cômodo viver assim, era cômodo deixar de viver sem sequer ter o trabalho de se matar. Para quê realizar algo que a própria natureza e força do tempo se encarregam de fazer? Se amaram, se completaram e se tornaram subsistência um para o outro, era o mutualismo que todo casal buscava. O padecer era pertinente, era fácil morrer dia após dia e isso os alegrava. A sede foi aumentando... aumentando... aumentando... A fome também. O amor não os sustentavam mais - a verdade é que nunca sustentou. Até que, findaram felizes e realizados. A morte os consumiu tão faminta quanto eles e junto com o fim da vida, veio o fim da fome, da sede, das cobranças, frustrações e da arte de lidar. Veio o fim do barulho vivo e do silêncio morto. Veio o fim de tudo e o tudo inclui o nada.

terça-feira, 6 de novembro de 2012

Gente, só gente.

Eu vejo gente... Vejo muita gente.
Vejo gente fazendo das minhas inseguranças mais um degrau para o sucesso.
Vejo gente mentindo para agradar,
                   fingindo para alcançar,
                   bajulando para conquistar,
                   chorando para comover,
                   mas querendo machucar.
Vejo gente esperneando e pulando para chamar a atenção.
Vejo gente humilhando e pisando, para se auto-firmar.
                  apontando para me julgar,
                  denunciando para escapar,
                  ofendendo para ganhar,
                 perseguindo para desencorajar.
Vejo gente gritando para intimidar e se manifestando por pura insegurança.
Vejo gente lutando para me frustar.
Vejo gente... Vejo muita gente.
Não vejo humanos.
               

sábado, 27 de outubro de 2012

Marasmo transgressor

Céu azul, nuvens claras como algodão puro, gaivotas emitindo seus encantos sonoros, o vidro transparente da janela deixava tudo nítido; tudo soava obra-prima, dádiva dos deuses que abençoavam aquele instante... Ele se pôs a beija-la, firme e suave; como um jardineiro poda sua roseira. A segurava firme no rosto tranquilo e pálido de quem se perdeu da razão. Tanta ânsia os conduziu ao baile da nudez inerente, eles beijavam-se como se não houvesse amanhã, consumiam-se no mais alto torpor do sabor, deliciavam-se com o roçar das peles e com a língua sedenta de desejo de apalpar cada pedaço ali exposto; era uma dança, ritmada pelo ''tum-tum'' do coração, sincronizada, a melodia era incorporada pela ofegante respiração e o palco lubrificado por suor. A expressão mais singela de amor ali fora consumada; impôs ao bom-senso que ficasse distante e demasiadamente ele obedeceu. Os olhos deles brilhavam, queimavam, choravam... Os olhos dela se exaltaram, acalmaram-se, sorriram. Os meus... Os meus olhos ardiam e morriam; ao notar que já não era o meu encanto que ali habitava, que não era a mim que ele enxergava. Cai, girei e continuei a cair, girando, girando... Estava tonta, mas leve; era escuro e tanto ele quanto ela haviam sumido; girei, girei e por fim acordei. Num súbito grito de dor; enxuguei minhas lágrimas e suspirei, não de alívio, mas insegurança.

segunda-feira, 8 de outubro de 2012

Espelhos

Olho meu reflexo no espelho, é mais uma manhã daquelas... Franzo a testa ao lembrar-me da redação a ser entregue, - não há nada mais deplorável do que um papel que não possa ser amassado sequer em suas pontas. Argh. - me viro e ponho a pasta dentro da mochila. Volto-me novamente para o espelho, minha feição mudou, - percebo - estou nua na alma, transparente a mim mesma, me enxergo, me noto, como ha muito tempo não havia notado; não sei porque num instante tão medíocre, sei apenas que não gostei.
Eu não havia apenas mudado de feição, não; já não era a mesma pessoa, que pensava daquela forma, que  vestia-se daquele jeito e tinha aqueles valores... Eu me perdi, mas não no tempo ou na vida, nem no amor ou  em qualquer controvérsia; não, me perdi de mim. Não era a mesma, minha essência escapou como o brilho escapa de um olhar amargurado. Amargurada: boa descrição para minh'alma. Vi a penumbra por baixo de minhas pálpebras, estava evidente; por quanto tempo ela me habitava? Vi um repuxado torto, que inclinava minha boca para baixo, era o desenho de um sorriso triste; ha quanto tempo o meu era? Vi uma face lisa, branca, nada maciça; cadê minha vivacidade? Vi tudo em morbidez profunda, escuro, gélido, exausto e morto. Minha gata derruba algo ao longe, me distraio e por impulso desvio a atenção do espelho, retorno e vejo um rosto rosado, sonolento, mas leve, feliz; com o brilho de uma criança. Estranho por um segundo mas, eu já estava atrasada... 

domingo, 7 de outubro de 2012

Arcano

É só mistério e não segredo.
Perca o medo.
Nada que você não possa saber,
Nada que te impeça de se aproximar;
É só bloqueio, um modo de averiguar.

Não assuste-se.
Tente me desvendar.
Os enigmas movem os homens,
Deixa eu te impulsionar;
Me descodifique,
Você vai se agradar
-Assim creio.

quinta-feira, 30 de agosto de 2012

Surreal


     Sinto o tremor; invade-me como o alívio de uma dor indo embora, uma vontade sessada; arrepio-me. Sinto cada vez mais - não me pergunte como -, a energia afundando em cada célula de meu corpo, mergulhando, penetrando o que era impermeável. Sinto a mesma energia passar por cada ligamento de minha coluna; um a um. Meus pelos eriçados como um porco espinho, sua boca delicia-se ao tocar a minha; seu olhar de cautela me quer, eu vejo. É tudo recíproco, acredite...
Dou risada para disfarçar tamanha vermelhidão ao notar que sou observada; digo ''pare'', mas gosto e peço que não, não pare.
     Teu afago é como brisa que refresca um rosto abafado por temperaturas elevadas e choros inacabados. Eu sinto o vento, sorrio, me satisfaço; parece sonho... É um fluido tão eficaz, denso e concreto; transborda. Sinto-me leve como uma pluma que é levada onde o acaso quiser, onde a ventania ordenar. Sinto-me guardada, como uma pétala em um botão. Teu sangue pulsa na mesma velocidade que o meu retorna; ganho vida novamente. Teu cheiro hipnotiza e dele me aproveito quando durmo. É um constante torpor.
     Estou à mercê da mãe-natureza e só vou se você for.

domingo, 12 de agosto de 2012

Forma-atar.

Dizem por aí, os mais sabidos, que me falta formatação
 Mas não ter forma
  Também é forma...
   Sigo meu padrão.
    Tanto que escrevo estes versos, sem ligar para o tal.
     O que me interessa é falar, fazer pensar
      E isso eu faço
       Mesmo que eu não seja a tal.
        Não tenho necessidade de me atar a forma,
         Não quero me formatar.
          Esse é meu exemplar de que
           Não importa como seja;
   Seja.

sábado, 11 de agosto de 2012

Quei-mar.

Queimo em mar, de mágoas ardentes, que refrescam a dor com seu sal, com sua cor viva que me faz nadar em inveja. O mar, com toda a sua mágoa, é mais vivo que eu; assim, pequena... Nado sem enxergar; o sal que refresca, cega.
Arde...
Arde.
Queima.
Ârrrr...
Meu braço geme, suplica uma pausa; meu metabolismo já não é o mesmo. É preciso calma para alcançar; penso ofegante. Não sei se paro e afundo ou morro a nadar, eis a dúvida de como me matar. Suspiro e dou um risinho sem graça alguma; é confuso decidir como afundar, qual opção me convém? D'um lado o ato de morrer nadando e ter honra; d'outro o desejo de parar e ter um último descanso antes de afundar. Eu me preocupava com a honra antes de morrer - deplorável.
Acordo com o zunir de algum inseto medonho, estou suada e percebo que o meu mar são lembranças, rancores e o sal é lágrima. Eu afundei ao nadar dentro de mim.

terça-feira, 31 de julho de 2012

O anjo

Vou ao infinito de pés no chão, caminhando lentamente, sem água, com você; pois sei que farias chover. Andaria nas brasas do inferno, calmamente; pois sei que me aguardaria do outro lado com cubos de gelo enrolados numa malha fina e macia, que acalmaria o sofrer e o ardor. Pois sei que provei da besta mais discreta, e falhei, e cai, e me enganei. Mas sei que o que tens de discreto, tens de valioso e que não és besta, mas anjo, que me envolve nas asas e me firma no chão segurando-me pelos ombros, para que toda a minha carga seja suprida pelo teu voo. Pois sei que se eu quiser, desces ao chão e me segura pela mão, sem largar, até o fim dos tempos; até as bestas invadirem o mundo e quando esta cena ocorrer, você levantará voo e eu criarei asas.

segunda-feira, 30 de julho de 2012

Sorriso tonto à caramelo.

Me pego nessa encruzilhada, de ser tua, amada, ou nada. Esse teu sorriso bobo de sonhador, dos sonhos que um dia meu olho sonhou e que ao abrir-se viu a escuridão e somente e apenas. Mas não brincas de ciranda pois tem medo que o anel de vidro se acabe junto com o amor. Eu entendo e aceito essa tua calmaria que tenta apagar a quimera aí dentro. Eu vejo e sinto. E gosto e agonizo. Me distraio com esse sorriso amarelado, olhar vazio - vazio porque precisa que eu crie o seu mundo. Não me torture mais. Entra logo nessa ciranda, vem aqui pro meu lado: Estendo a mão e você pega, segura firme, não solta e roda, gira, baila comigo no círculo da vida. E quando eu for para frente, você também vai; quando eu for para trás, você também vai. Onde eu for, o que eu fizer, você me imitará, certinho, no mesmo compasso que é para não desequilibrar a ''brincadeira''. Não me deixa me perder nunca mais. Eu peço, suplico, não tão encarecidamente assim; roda comigo.

sexta-feira, 20 de julho de 2012

A máscara do poder

Estive em casa, com minha mãe protetora e meu pai zeloso, estive em meu quarto com meu ursinho, travesseiro e CD's  que me fazem rir, dançar com os pés no ar e minha mente bailar pelo mundo e de repente a sombra invadiu o lugar que por direito pertencia a minha luz e eu senti a angústia ser cravada em minhas costas, como um peso, uma cruz, que dói e me fez curvar a postura - que deveria ser ereta. Uma máscara surgiu em minha visão e ela se aproximou de minha face e senti quão gélida e amarga era; fez-me parar de salivar e embaçou minha visão com uma espécie de fumê que me tirou a nitidez, as cores... Senti um rancor me invadir, uma morbidez externa e tremor profundo. Uma serenidade segura e falsa. Ouvi um sussurro ''É assim que deve serr... Shii... Não tema, todos são assimmm...''; a voz era forte e suave o que a tornou sedutora e me senti conduzida a obedecê-la. O fiz, imediatamente e sem questionar. Disfarcei a dor, me pus ereta novamente, mantive o olhar distante, sereno e misterioso, desatei a mão que estava fechada em punho... A abri, como quem fica feliz em recebê-lo - mentira - e sorri, com a mais perfeita expressão que uma atriz pode ter. Mas algo em mim gritou querendo sair, era a luz. A sanidade queria espaço, queria ar! Mas a máscara a continha e um conflito surgiu em mim. Não sei se por medo - o mesmo medo que a máscara me induziu a perder - ou por raiva; apenas chorei. A máscara não aceitou e disse-me em pensamento ''Você não é tão boa quanto pensei, me perdeste.'' e saiu de meu rosto. Sua voz não fora sedutora, mas rude e autoritária, como de quem detinha o controle do mundo - e tinha. Chorei de novo, de alívio. Senti que por um momento deixei o mundo mudar quem eu sou, senti que fui dominada pelo mal, fui fraca e o sistema desumano tinha-me em seu controle; desabei em minha cama e afirmei a mim mesma que nunca mais ninguém me roubaria de mim.

terça-feira, 3 de julho de 2012

Epigrama de amor

E como já disse Camões: Amor é fogo que arde sem se ver;
amor dói,
machuca,
faz o homem pirar
e a mulher é a paranoia - ou o contrário.

Gente gosta de sofrer,
gente gosta de sentir,
eu - graças a Deus - não sinto nada além de mim.

Amor é incerto,
irreal,
e ilude;
gente gosta de sonhar,
gente gosta de iludir.

E então percebo que sonho é protótipo de ilusão;
sinônimo mascarado.
Percebo também,
que o amor está nesse barco.

domingo, 1 de julho de 2012

Meu casulo

Alguns anos atrás - Lembro-me como se fosse ontem - em uma dessas conversas entre adulto e criança (que raramente tem assunto), uma senhora de meia idade questionou-me: Se você fosse um bicho Gabi, o que gostaria de ser? Claro que não lembro da resposta, nem se respondi e me senti desafiada a saber a resposta, melhor; não me importa que bicho eu gostaria de ser, mas qual deles eu sou.
Mais anos se passaram desde aquela pergunta e após muitas idas e vindas, - Que foram muitas - descobri! 

Eu não voo, mas sonho e mudo, transformo-me; me resguardo, cavo um buraco no meu mundo e por lá mesmo permaneço, durante dias, horas, segundos... Eu me alimento, me preparo, me habilito antes de sair mundo afora. Sempre conheço os espinhos antes das flores; enfrento as dificuldades da vida, me fortifico para depois planar.
A verdade é que sou uma lagarta - Ainda - no jardim da vida, que encara os galhos no chão, os insetos mais fortes, conhece os espinhos das flores e me resguardo em meu casulo, para depois transformar-me numa borboleta, de asas delicadas mas resistente; de aparência frágil - E de fato sou - mas sábia, que voa livre por cima das flores e dos galhos e que exala beleza e brilho por onde passa.
Ainda sou lagarta... Hei de virar borboleta.

terça-feira, 5 de junho de 2012

segunda-feira, 23 de abril de 2012

A raça desumana

Me deparei com aquela cena triste; miserável e da mesma forma de quem lê esta narrativa, também não me importa onde nasci, o que faço, meu nome ou qualquer outra definição. Tudo teoria, conceito; qual o valor disso?
O real estava diante de mim e nada pude fazer contra. Não soube distinguir de imediato quem era o bicho, nem quem era gente. Não tinha gente. Aquela criatura de pele negra, nativa e reflexo de sua nação, exalava um odor de carne-viva e estava perto da morte. Carregava em si; sem pernas ou força, a refeição do animal, que tinha mais dignidade que aquela criança; aquele resto de criança.
O clima, o chão, os galhos, as plantas; toda a mãe-natureza estava a favor de seu filho, o abutre, é claro; os humanos deixaram de ser filho da ''mãe'' há muito tempo. E eu ali, com os pés fincados em completa inércia; com alguns sentidos aguçados, para outros esquecidos. Só via e sentia; tudo era silêncio e meu tato fora ignorado. Minha boca tinha se esquecido da saliva e meus dentes trincados com a mesma força com que fechei minha mão em punho; sentia raiva de mim, muita raiva...
Eu enxergava nitidamente um pássaro faminto, acompanhando sua ''criança-almoço'' até a morte; eu vi, eu estava ali, eu nada fiz... Não sabia o que fazer, tinha algo a ser feito? Se não fosse aquela criança, seria outra; ou não fosse aquele animal, existiam vários e até mais fortes e famintos.
Aquele pedaço de gente pagava o preço da minha luxúria, da riqueza de poucos, da falta de ética, falta de compaixão. Foi ali que eu percebi que, assim como a maioria dos humanos, também me faltou humanidade. Eu era a miséria daquela ''coisa''.

segunda-feira, 19 de março de 2012

Daqui por diante

Decidi rir, sem querer acreditar que ‘’aquilo’’ tinha acontecido comigo; ri para não chorar, por medo, angústia, não sei... Existem sensações que não se podem expressa-las. Respirei fundo, criei coragem e mantive o sorriso no rosto, tentei transparecer felicidade ou leveza, mas não deu.
Guardei o pequeno teste de farmácia na bolsa e ri mais um pouco, após pensar que aquela pequena ‘’caneta’’, aquele pedaço de plástico, tinha determinado minha tão sonhada gravidez, tão precocemente.
Me levantei, lavei o rosto suado, troquei de roupa e fui encontrá-lo na estação de trem, onde tudo começou e se tivesse de ser, ali acabaria. Procurei andar depressa, observei as pessoas; temendo meu incontrolável pensamento. Ao chegar na estação, o vi sorrindo meio preocupado, curioso e eu sabia perfeitamente o que significava toda aquela ansiedade. O abracei, sem muito apego, pois não sabia se aquele seria o último abraço, então seria melhor sem despedidas; queria ir direto ao ponto e fui.
-Estou grávida...
Soltei na lata. Comecei a chorar, minha visão embaçada impediu-me de ver sua reação imediata, estava tudo turvo e me sentia tonta; creio que ir direto ao ponto me fez ficar mais surpresa do que ele, como se só ali eu tivesse admitido a mim mesma que tinha uma vida dentro de mim e que esta destruiria a minha.
Tentei olhá-lo e percebi que ele ficou sem me ver por alguns minutos, como se viajasse para outro mundo, mesmo com toda aquela multidão; exatamente como eu. As pessoas nos olhavam e isso me irritava muito, o que elas provavelmente pensavam, vendo tudo aquilo, não me interessava e eu queria deixar isso bem claro! Me senti tonta novamente e cambaleei, ele percebeu e me abraçou firmemente, sustentou meu corpo no seu, saiu de seu ‘’transe’’; chorei em seu colo e não senti mais nada, desmaiei.

sexta-feira, 16 de março de 2012

O poder da rosa

Tínhamos passado a manhã toda brigando, eu chorei, ele chorou e assim o dia se prolongou.
Fui para a casa da minha amiga, que aqui não convém identificar, estudar química, pois ela estava morrendo de medo da prova... Saímos do colégio e pegamos o ônibus, como sempre, fomos o caminho todo conversando besteiras e rindo alto demais para o silêncio que se fazia no automóvel, só ouvia-se o barulho do motor e de alguma música da rádio ecoando ao fundo, nem distinguia-se a letra, ou sequer o ritmo da música; não me importava... Essa minha mania de observar demais já era tão costumeira que nem me espantava com o que percebia. As pessoas do ônibus tinham rostos enrijecidos, numa máscara de cansaço e stress e até as que dormiam nas cadeiras desconfortáveis mantinham a expressão dura e seca, me perguntei se em alguns dias eu também tinha essa expressão, mas como já disse, não me importo muito com minhas observações.
Chegamos. Descemos do ônibus quase que correndo, pois não tínhamos visto o nosso ponto chegando, de tão entretida que estávamos... Andamos até o prédio e percebi que na calçada de cimento para entrada do hall, tinha uma marquinha bem pequena de pata de gato neném, pensei no tamanho da criaturinha que tinha posto as patinhas ali e me lembrei da vez em que vi um cimento mole e de brincadeira risquei meu nome com o palito de pirulito que eu tinha. Isso me fez rir, minha amiga me perguntou o que foi e eu lhe contei... Ela riu e confessou que já tinha feito o mesmo.
Chegamos no apartamento, comemos um macarrão deliciosamente preparado por sua mãe e finalmente estudamos, sem parar, o dia todo, até escurecer... E durante todo esse tempo a única coisa que observei foi o fato dele não ter me ligado ou mandando uma mensagem sequer. Me preocupei, mas meu orgulho me fez esquecer essa constatação rapidinho.
Finalmente, no término do dia do estudo, quando tanto eu quanto minha amiga estávamos afiadas em estequiometria, ele me ligou, perguntando se eu queria ir lanchar, pra conversarmos; fiquei meio preocupada pois ele nunca tinha me chamado pra ''conversar'' antes, não nessas situações de brigas, mas aceitei, eu tinha outra escolha?
Ele veio me buscar e só em vê-lo a raiva passou e quando ele me estendeu uma rosa e falou, melodicamente, com um sorriso no rosto (ele sabe o poder que seu sorriso exerce sobre mim):
-Me desculpa...
-Será que devo?
Estávamos no meio da rua, perto do ponto de ônibus de frente a portaria do prédio da minha amiga... Olhei para o vidro fumê da ''casinha do porteiro'' e vi o bastante (dois olhinhos arregalados, atentos ao que acontecia do lado de fora, onde eu estava), ele percebeu pelo meu olhar que eu concluiria que ali não era o melhor local para aquela conversa e disse:
-Vem, vou te levar pra lanchar.

E eu nem ligava mais para a conversa, já o tinha desculpado mesmo... Queria era comentar da rosa, pois essa observação eu não deixaria passar.